Nos olhos de Van Gogh encontro
meu pai.
_ Pai, por que some tão distante da tela?
Se encontrasse a altura e
profundidade que teu olhar sempre desejou alcançar, talvez compreendesse mais a
imensidão que sua angústia pinta de amarelo.
Na sala da casa, uma réplica das
telas de Van Gogh, em quebra cabeça. Nas texturas dos encaixes lá está os olhos
do meu pai. Quem sabe eu tenha puxado teu olhar e por isso compulsivamente
necessite ser amarela.
Eu puxo teus olhos nos meus, sei
que dói existir. Prefiro fechar, mas no amarelo do teu olhar fico
incolor, tento mudar o calor desta matiz.
Hoje acordei amarela. Sei que
há muita existência para pouca vida, e que hoje a tarde vou me desbotar,
perder toda a força desta cor...
Uma vida é pouco para tantos olhos de Van Gogh. É curta pra tanta fome de amarelos que temos e tudo o que desejamos ser. Porque mesmo que sejamos, nunca seremos, a não ser que eu me entregue
a quem definiu minhas cores.
Meu pai agora está nos olhos de Deus, ele deve estar pintando o céu. Enquanto no passado toda a angústia daquelas pinceladas sacrificavam seus olhos, agora descansa alimentado em amarelo.
Será que puxei a cor do teu olhar? Pai, pinta meus olhos!
Será que puxei a cor do teu olhar? Pai, pinta meus olhos!